quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Ecologia e cuidado

Ecologia e cuidado

Em busca de um ethos que sustente a vida

Ir. Maicon Donizete Andrade Silva, FMS

O ser humano constitui-se, por essência, como um ser social e, por conseqüência direta, um ser de relações. Enquanto pessoa, estabelecemos elos de relação conosco mesmos, com as pessoas à nossa volta, com a natureza, com o transcendente e tudo o mais que existe. Toda relação implica contato com uma realidade a partir da qual vamos nos construindo culturalmente, a partir de uma carga de valores e princípios que passarão a orientar nossa existência.

Falar de ecologia e cuidado implica necessariamente falar do modo como estabelecemos relação com o meio que nos circunda. É essa relação que vai apontar nossa capacidade de pertença e sintonia com o mundo a nossa volta. A palavra ecologia deriva do grego “oikos”, que significa “casa comum”, ou seja, constitui-se como a inter-relação que estabelecemos conosco mesmos e com o meio ambiente. Nesse mesmo sentido, o termo cuidado nos remete a um “modo de ser” singular do ser humano, ou seja, está relacionado à natureza do ser enquanto ser-no-mundo.

Por “ethos” (grego) podemos compreender como sendo a “morada humana”, ou seja, nossa essência ou o conjunto de princípios que norteiam a vida da comunidade humana. Daí provém a palavra ética, que nos aproxima da relação estabelecida conosco e toda a realidade a nossa volta. Ao pensar em ethos, somos convidados a pensar no “ethos humano” como algo que nos faz conscientes de nossa condição de criatura chamada a colaborar com a continuidade do mistério criacional, a partir de uma relação de preservação e cuidado.

Ao olhar a realidade a nossa volta nos deparamos com um grave problema que atinge não somente o ser humano, mas influencia toda forma de vida e o planeta como um todo, que consiste nas relações individualistas e fragmentadoras da realidade. Nesse sentido, a preocupação do sujeito, centrada somente sobre si e o seu bem-estar pessoal, é geradora de uma humanidade sem sensibilidade relacional.


Vivemos numa sociedade marcada por muitas contradições que denigrem aquilo que o ethos verdadeiro propõe como essência própria da dignidade humana. Por exemplo, podemos citar a descartabilidade das relações, a fragilidade da política que, em muitas situações, coloca-se como instrumento para benefício e enriquecimento de uns poucos, à custa da exploração de muitos e também uma educação que não oferece à população uma formação sólida e com qualidade, capaz de formar sujeitos conscientes de seus direitos e deveres. Junto a isso, soma-se a realidade de degradação do planeta, fruto de uma desenfreada exploração dos recursos naturais.

A canção “coração de estudante”, de Milton Nascimento, lembra-nos que “há que se cuidar do broto, pra que a vida nos dê flor e fruto”, e, em seqüência, também nos diz que “é preciso cuidar da vida e do mundo”. Essa, com certeza já seria uma boa síntese para compreendermos que ecologia e cuidado são palavras inter-relacionadas. São como que expressões indicativas de ação/movimento que nos pedem postura, ou seja, uma atitude de sair do lugar cômodo para assumir uma atitude de cuidado ativo, capaz de conduzir-nos a um posicionamento compromissado com o cuidado com a vida, como condição fundamental para a continuidade da existência.

Ecologia e cuidado vem como sinaleiros que nos apontam o ethos sustentador da vida. Por isso, torna-se urgente resgatar o sentido profundo dessas expressões que nos convocam à consciência de que pertencemos a uma “casa comum” (oikos) que precisa ser cuidada como o broto, para que continue a nos dar flor e fruto. Aí se constrói nossa “morada humana” (ethos). O ethos é nossa essência enquanto seres humanos. Ele é o fundamento da vida e, a todo instante, nos indicará se estamos ou não, de fato, comprometidos com a sustentação da vida humana e a preservação do planeta.

Fica a necessidade de, permanentemente, renovar em nós a esperança e o desejo de construir um mundo novo, moldado por uma profunda sintonia na relação homem-natureza. Nessa nova relação, o ser humano é chamado a arriscar sem medo, superar suas presunções, conquistar novos horizontes e oferecer seu tempo e sua inteligência como ingredientes necessários ao “prato da vida”, do qual o ingrediente mais importante é o “ethos”, que nos conduzirá à nossa essência de “imagem e semelhança de Deus”, chamados a colaborar como co-criadores na plenificação da vida.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Ecoalfabetização e Consumo

A passagem necessária da lógica produção-consumo à ecoalfabetização

“No passado, penso logo existo. No presente, nem penso logo consumo. No futuro penso, por quê?” (Anita Prado)

Ir. Maicon Donizete Andrade Silva, FMS

Ao olhar a intensa realidade do sistema de produção e consumo da sociedade contemporânea, é perceptível a necessidade de uma reflexão apurada acerca da temática “ecoalfabetização e sustentabilidade” como caminho necessário para um despertar da consciência humana quanto à importância de uma educação ecológica capaz de desenvolver no ser humano a sensibilidade para o cuidado e preservação do planeta.


Frente ao sistema de produção-consumo que impera na sociedade do capital, faz-se necessário uma atenção especial para os danos provocados por essa exploração desenfreada que foca seu olhar somente sobre a sua capacidade de gerar capital. Dessa forma, a lógica que move o mercado do consumo desenfreado é “diga-me quanto consomes e te direi quanto vales”. A partir dessa ótica, percebemos como o ser humano foi se desvalorizando ao longo da história, chegando ao ponto de se tornar somente objeto consumidor do que o mercado produz.

O consumidor exemplar é aquele que consome sem mesmo se perguntar sobre a origem do produto consumido. Este não se preocupa em questionar as estrurturas sociais às quais vive submisso. Não interessa ao mercado que seu consumidor tenha capacidade de reflexão e visão crítica, mas somente que se sinta feliz e satisfeito com aquilo que lhe é oferecido. Reforça a idéia de um ciclo linear pela lógica do produzir-consumir-descartar, produzir-consumir-descartar... Esse é o caminho vicioso que movimenta o mercado capitalista que quer enriquecer-se a qualquer custo.

Falar em ecoalfabetização e sustentabilidade implica tecer uma crítica ao sistema de produção e consumo dos grandes mercados como os Estados Unidos, crítica essa que pode ser estendida a todos os países de primeiro mundo e também aos países em desenvolvimento, que são verdadeiros “consumidores” dos modismos lançados pelos considerados países ricos. Essa é a reprodução do que se falava nos EUA no período anterior à crise de 29. Era a euforia do consumo, ilustrada pelo slogan “american way of life” (estilo americano de vida) que passou a influenciar todo o mundo desde este perído até a atualidade.

Um elemento importante de percebermos é a descartabilidade das coisas na atualidade (cultura do descartável). Aqui, além dos objetos utilizáveis, podemos acrescentar as relações que muitas vezes se tornam descartáveis. Isso mostra a realidade atual da preocupação do sujeito estar focada somente sobre si mesmo, sem qualquer preocupação com as pessoas e nem com o meio à sua volta. Dessa forma, qualquer atitude de cuidado para com a vida humana e a vida do planeta perde o seu valor. As relações só são valorizadas se trazem prazer e contentamento, o que em muitos casos é confirmado por uma pseudo-felicidade.

O mercado fomenta uma aparente necessidade de consumo como caminho para falso bem-estar. No próprio ato da propaganda faz-se a apresentação de um produto que, além de si mesmo, carrega um grande teor simbólico. Na roupa tão bem apresentada pelo modelo, no creme dental que deixa os dentes brancos e o sorriso bonito, no carro que atrai a atenção das mulheres bonitas, na cerveja do final de semana que traz a imagem da mulher sexy do comercial, no protetor solar usado pela moças na praia que é capaz de atrair e deixar os homens a seus pés, em tudo isso há um despertar no indivíduo da ilusão de sentir-se como os atores bonitos, ricos e felizes apresentados nos comerciais. É um mercado que forja e cria necessidades a partir das quais é necessário consumir sempre mais para alcançar a dita realização; quem não consome está alheio à “onda do momento”.

Frente a essa realidade, é importante construirmos uma nova lógica não mais sustentada pela cultura do consumo, mas sobre uma cultura de cuidado e preservação. A ecoalfabetização é uma chamada de atenção para a necessidade de uma alfabetização ecológica que conscientize o ser humano quanto aos impactos causados por essa lógica desenfreada de produção-consumo que atualmente vigora. Eis que o desafio que se impõe é conciliar desenvolvimento e ecologia. Algo importante nessa perspectiva, é resgatar a relação homem-natureza como seres interdependentes dentro da teia da vida (rede de relações). Somente um ser ecologicamente alfabetizado tem possibilidade de questinar as estruturas sociais que fomentam o consumo desenfreado e a exploração desmedida do ecossistema.

É fudamental resgatar o equilíbrio adormecido existente entre economia e ecologia, duas variantes com raiz comum que tem papel importante no desenvolvimento humano. Por ecologia entendemos a interrelação que o ser humano estabelece entre si e o ecossistema, e economia consiste na produção, distribuição e consumo de bens e serviços. Em sintese, podemos dizer que os dois termos são correlacionados, pois ambos, por essência, estão em função da vida humana e planetária. Economia e ecologia originam-se do grego “oikos”, que significa casa comum, morada. Esse é o sentido fundamental que precisa ser resgatado que é a relação de cuidado para com a nossa casa comum que é o planeta terra.

A consciência quanto à diversidade da vida terrena nos alerta e nos faz tomar consciência quanto às riquezas existentes no mundo onde vivemos. A volta ou mesmo a construção de um equilíbrio na relação homem-natureza é uma atitude de resiliência que pode nos aproximar de uma nova relação de sustentabilidade que faça a vida prosperar de forma sadia e equilibarada. Por isso é importante hoje reacender no coração humano os valores que os princípios da ecologia carregam em si: interdependência, reciclagem, parceria, flexibilidade, diversidade e sustentabilidade. Da consciência desses princípios depende a sobrevivência da humanidade que passa necessariamente pela alfabetização ecológica.



quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A construção da identidade Afro-descendente

 A construção da identidade Afro-descendente na Pastoral Afro


Imagem: Paulo Fortes

A identidade afro-descendente como processo de construção

Ir. Maicon Donizete Andrade Silva

Apresentação

Este artigo tem a finalidade de refletir sobre o processo de construção da identidade do negro e da negra na Pastoral Afro-brasileira e como se constitui o caminho de conscientização quanto à negritude. Para tanto, faz-se necessário a compreensão de alguns termos fundamentais: identidade, afro-descendente, negritude, Pastoral Afro. A percepção do modo como esses elementos se entrelaçam nos ajuda a perceber que o caminho de conscientização e formação de uma identidade afro-descendente é um processo a ser construído.

A partir de ricas experiências no seio da Igreja como os APNs (Agentes de Pastoral Negros), GRENI (Grupo de Reflexão dos Religiosos Negros e Indígenas), Instituto Mariama e outros, percebemos que esses são espaços decisivos na via eclesial que muito colaboram no processo de construção da identidade do povo afro-descendente. São grupos de ação diretamente ligados à Pastoral Afro-Brasileira que, em comunhão com a Igreja, buscam tecer um novo olhar de sociedade na ótica da negritude.

No presente texto mostramos como a Pastoral Afro-brasileira contribui nesse processo de construção identitária e na auto-afirmação dos afro-descendentes quanto ao ser negro e negra, no que diz respeito à valorização de suas raízes africanas.

Clique aqui para ler o texto na íntegra

sábado, 7 de agosto de 2010

Só depende de nós...

Só depende de nós...


"Hoje levantei cedo pensando no que tenho a fazer antes que o relógio marque meia noite. É minha função escolher que tipo de dia vou ter hoje.

Posso reclamar porque está chovendo ou agradecer às águas por lavarem a poluição. Posso ficar triste por não ter dinheiro ou me sentir encorajado para administrar minhas finanças, evitando o desperdício. Posso reclamar sobre minha saúde ou dar graças por estar vivo.

Posso me queixar dos meus pais por não terem me dado tudo o que eu queria ou posso ser grato por ter nascido. Posso reclamar por ter que ir trabalhar ou agradecer por ter trabalho. Posso sentir tédio com o trabalho doméstico ou agradecer a Deus por ter um teto para morar.

Posso lamentar decepções com amigos ou me entusiasmar com a possibilidade de fazer novas amizades. Se as coisas não saíram como planejei posso ficar feliz por ter hoje para recomeçar.

O dia está na minha frente esperando para ser o que eu quiser. E aqui estou eu, o escultor que pode dar forma.

Tudo depende só de mim."

(Charles Chaplin)

sábado, 26 de junho de 2010

GRENI (Grupo de Religiosos e Religiosas Negros/as e Indígenas)

Religiosos e Religiosas Negros/as e Indígenas

- Unidos no AXÉ das raízes afro-indígenas -

 “A partir do compromisso histórico de anunciar um tempo novo, onde o povo negro e o povo indígena possam aprofundar sua fé e a fé de sua comunidade, buscando o reencontro das suas raízes históricas, objetivamos ser um grupo que estimule o processo de reflexão sobre a Vida Religiosa afro e indígena, abrindo-se a novas formas de organização, na recuperação da identidade e dos valores culturais dos povos negros e indígenas, em comunhão com a CRB.”

Imagens da visita do GRENI-BH aos Índios Pataxós (Carmésia/MG) realizada entre os dias 18 e 20 de junho de 2010.














quarta-feira, 2 de junho de 2010

FELICIDADE

A IDADE DE SER FELIZ
(Geraldo Eustáquio de Souza)

Existe somente uma idade para a gente ser feliz.
Somente uma época na vida de cada pessoa
em que é possível sonhar e fazer planos
e ter energia bastante para realizá-los
a despeito de todas as dificuldades e obstáculos

Uma só idade para a gente se encantar com a vida
e viver apaixonadamente
e desfrutar tudo com toda a intensidade

Fase dourada em que a gente pode
criar e recriar a vida
à nossa própria imagem e semelhança
e sorrir e cantar e brincar e dançar
e vestir-se com todas as cores
sem preconceito nem pudor

Tempo de entusiasmo e de coragem
em que todo desafio é um convite a lutar
com muita disposição de se tentar algo novo de novo
e de novo e quantas vezes for preciso

Essa idade se chama presente e é tão passageira
que tem apenas a duração do instante que passa
doce pássaro do aqui e agora
que quando se dá por ele
já partiu para nunca mais.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Palavras de um futuro bom

"Enquanto a sociedade feliz não chega, que haja pelo menos fragmentos de futuro em que a alegria é servida como sacramento, para que as crianças aprendam que o mundo pode ser diferente. Que a escola, ela mesma, seja um fragmento do futuro..." (Rubem Alves)